22 janeiro 2020

Malassadas e mascarados

14:01



Artigo de opinião por Gil Rosa.

À medida que o mês de fevereiro se aproxima, aproxima-se também o cheiro das malassadas.
Vem aí o carnaval.
Com os novos tempos as malassadas começam a ser confeccionadas quase logo após o período de festas do Natal e do final do ano.
Antes não era assim. Mandava a tradição que esta iguaria só se confeccionasse quase no dia do entrudo.
Quando era criança adorava estes momentos lá em casa. Adorava assistir ao momento em que minha mãe batia aquela massa. Eu e os meus irmãos gostávamos sobretudo de ajudar a partir os ovos. Quase que nos atropelávamos junto à banheira onde a minha mãe mexia a massa. Não deixava de ser curioso quando o ovo caía na farinha e a gema se desfazia com aquela cor amarelada em grande destaque.
As malassadas da minha mãe tal como na zona eram simples. Farinha, água, fermento, ovos caseiros e raspa de limão, eram estes os ingredientes. Os sonhos e outras coisas afins muito em voga nos dias de hoje nessa altura não existiam.
O que existia, isso sim, era a mestria de transformar aquela massa numas malassadas de sabor incomparável.
Recordo-me dela estar a amassar e a brincar connosco cantarolando: “trupe trupe, malassadas com açucre”, e nós fazíamos coro.
Depois vinha o tempo de levedar e logo a seguir a fritura. E nós voltávamos para junto ao lar ou do fogão para ir acompanhando o processo. Claro que estávamos ansiosos para começar a comer as primeiras malassadas bem quentes que iam saindo da panela.
Para mim era mesmo sem mel ou açúcar. Uma verdadeira delícia.
Lá em casa era assim, na casa de uma tia de mais idade era um pouco diferente, com um ritual mais antigo.
O processo de amassar era igual, mas quando chegava à hora de fritar aí as coisas mudavam.
Na casa da minha tia a comida era toda feita no lar, a lenha, numa cozinha muito antiga.
No dia das malassadas havia quase que um ritual completamente diferente.
A minha tia improvisava um lar no meio da cozinha, cujo chão era de pedra calçada. Era aí que colocava uma pequena panela de ferro das antigas com três pés. Deitava a banha e depois começava a fritar as malassadas. Isto era feito como é bom de perceber ao nível do chão. E lá estávamos nós, ali sentados, à volta da fogueira a assistir à operação. Antes de começar a fritar, minha tia ainda nos pedia para irmos à rua buscar duas caninhas de bambu. Ela afiava as canas às quais lhe chama de “gravetos” e era com este “talher” improvisado que ia mexendo as malassadas e espetando-as para ver se estavam no ponto.
Esta operação fazia-se aí a meia tarde. Mal começava a anoitecer, começavam a surgir os mascarados.
Gente das redondezas, com disfarces algo rudimentares e que logo batiam à porta. De cara tapada e de voz alterada para não serem reconhecidos vinham pedir malassadas. Alguns eram quase fáceis de os identificar, mas outros só mesmo no dia seguinte depois dos próprios se revelarem é que eram reconhecidos.
Nessa altura o carnaval era mesmo um dia especial.

Fonte: JM-Madeira

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