Não são muitas as especialidades da doçaria madeirense. A par com os bolos de mel, as queijadas sempre mereceram particular referência na pastelaria. Ficaram célebres as queijadas da Confeitaria Felisberta, da Mimo ou da antiga Penha d’Águia.
Hoje é difícil encontrar uma boa queijada no mercado regional. A industrialização do produto e a sua adulteração retiraram-lhe o sabor e também a forma tradicional. Agora até são congeladas e descongeladas conforme a procura.
É claro que ainda há dois ou três lugares onde se pode adquirir uma boa queijada. Boa, mas não a verdadeira! Infelizmente, na generalidade não se recomendam. As das máquinas de venda automática são de péssima qualidade. E é pena, porque um destino turístico também vive de produtos tradicionais, genuinamente preparados.
Em 2019, no certame as Sete Maravilhas Doces de Portugal, as queijadas da Madeira foram amplamente divulgadas e elogiadas, apresentando-se as melhores que se produziam na ilha, as da pastelaria Miminho, sendo esta especialidade escolhida como representante da Região Autónoma da Madeira.
Provavelmente, a queijada tem origem conventual, como, de resto, muitos outros doces. Nos registos de despesas do Convento de Nossa Senhora da Encarnação, do Funchal, encontramos referências à aquisição de ingredientes para a confecção de queijadas, no século XVIII. Contudo, não se conhece a receita das monjas clarissas.
O que distingue uma boa de uma má queijada é a farinha que se acrescenta ao requeijão, no recheio.
Num episódio do programa da RTP-Madeira Esquina dos Doces, em Setembro de 2019, vi, com estupefacção, um pasteleiro misturar excessivas quantidades de farinha e açúcar com requeijão, na produção em massa de queijadas. Evidentemente, que o resultado não pode ser bom, mas, quem não conhece, come e não reclama. Contenta-se com o docinho. Outros, mais esclarecidos, não voltarão a gastar dinheiro com queijadas daquele tipo.
Antigamente, não se adicionava farinha ao requeijão. Entre outros, o Tratado Completo de Cozinha e de Copa, de Carlos Bento da Maia (Lisboa: Livraria Editora Guimarães & C.a, 1904), apresenta uma receita de queijadas da Madeira, na qual os ingredientes do recheio são o requeijão, açúcar pilado, gemas e claras de ovos. Para a massa, farinha de trigo, manteiga e açúcar q. b. para adoçar levemente. Já confeccionei queijadas, seguindo esta receita, e o resultado é sempre muito bom. Não tem mesmo nada a ver com o que por aí se apresenta e vende.
Idêntica receita foi também publicada em Aprender: Cozinha Madeirense (1988) e no Almanaque PEF (2000). Com ironia, posso concluir que o segredo das verdadeiras queijadas da Madeira é não adicionar farinha ao requeijão. Os outros ditos segredos, que os pasteleiros gostam de insinuar com ar enigmático, são perfeitamente dispensáveis. Fazem parte da fantasia da cozinha. Dir-me-ão que, não acrescentar farinha, encarece o produto, reduz as vendas e baixa o lucro. Acredito que sim! A qualidade, porém, tem custos.
A queijada da Madeira, a que merece este título, tem de ser autêntica. Deveria ser certificada. São as coisas diferentes que marcam a diferença. Num mercado competitivo, a qualidade, a diferença e a inovação são vectores essenciais.
Fonte: Funchal Notícias
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