19 janeiro 2015

Direcção de Pescas tenta manter ‘gata’

09:36

Regulamentos europeus proíbem a ‘gata’, mas há promessas para contrariar a ideia.


A Direcção de Pescas da Madeira está a estudar mecanismos e técnicas para afastar os tubarões de profundidade, vulgarmente designados por ‘gata’, dos anzóis do peixe-espada, para contornar a proibição de captura imposta este ano pela União Europeia (UE).
A decisão de Bruxelas tem causado grande polémica em Câmara de Lobos, o concelho vizinho do Funchal a oeste, pois esta espécie é uma das iguarias culinárias típicas, servida como “dentinho” (petisco) para acompanhar a tradicional poncha (bebida).
“Apuraram-se várias técnicas, os pescadores sabem perfeitamente quais são e é preciso comunicá-las à UE, para mostrar que estamos a fazer esforços para diminuir a captura destas espécies”, sublinhou o director regional, Luís Ferreira.
Até à entrada em vigor da proibição, a 1 de Janeiro de 2015, a Madeira beneficiou de um regime de excepção. A pesca de tubarões de profundidade (que são inofensivos para as pessoas e podem atingir 1,5 metros de comprimento) era permitida no âmbito da faina do peixe-espada, já que estes mordem os mesmos anzóis.
A UE aceitava o facto de ser artesanal, acessória e tradicional em Câmara de Lobos, onde a ‘gata’ é referência gastronómica, atracção turística e suporte financeiro dos pescadores.
A frota de Câmara de Lobos, com 22 barcos, estava autorizada a descarregar 5% de tubarão de profundidade inserido no total anual da quota de peixe-espada, actualmente de 3.141 toneladas.
O pescador Eleutério Abreu sabe bem quanto vale a ‘gata’: “Na lota, o preço corre a 1,5 euros ao quilo e o óleo é vendido a 600 euros cada bidão. Como é que vai ser, agora que tiram esta parte do nosso rendimento?”, questionou.
E explicou: “A ‘gata’ vem por acaso nos anzóis e chega morta ao barco. Não a podemos trazer para terra, mas também não a vamos deitar a perder. Vamos usá-la como isco, é isso que vamos fazer”.
Nos restaurantes junto à baía de Câmara de Lobos também impera a contrariedade. Atrás do balcão de um snack-bar, José Manuel salientou: “Não vejo lógica em acabar com isto. Será triste vir tomar uma poncha e não ter um ‘dentinho’ de ‘gata’ em cima da mesa”.
Também o presidente da câmara, Pedro Coelho (PSD), está do lado dos pescadores e comerciantes. “Vamos fazer tudo por tudo para mostrar às entidades competentes que o regime de excepção tem de continuar, porque a ‘gata’, além de ser uma fonte de rendimento, é uma marca deste concelho”, disse.
A Academia Madeirense das Carnes/Confraria Gastronómica da Madeira (com sede em C.ª de Lobos) revelou uma posição mais radical ao mostrar-se disponível para organizar uma manifestação em Bruxelas.
Regulamento apertado
Segundo o regulamento de proibição, os últimos pareceres científicos indicam uma “exploração insustentável” dos tubarões de profundidade e que as principais espécies comerciais estão “depauperadas”, defendendo uma redução da pesca até que se registe uma “tendência positiva”.
Os argumentos não convencem o director da Estação de Biologia Marinha do Funchal, Manuel Biscoito, que diz que as medidas de gestão de recursos e preservação de espécies têm que ser “exequíveis”. “Na prática, a pesca do peixe-espada preto não vai acabar e, não sendo possível descarregar o tubarão, que é capturado nos mesmos aparelhos, significa que ele vai continuar a ser apanhado e deitado borda fora”, disse, considerando que a medida será ineficaz e não permitirá quantificar o impacto da pesca sobre tais espécies.
Na Madeira, estão referenciadas pelo menos 15 espécies de tubarões de profundidade, que vivem entre os 800 e 2.000 metros. São vulneráveis porque têm crescimentos lentos e longevidades grandes. ‘Gata’ é o nome vulgar de uma das espécies - curiosamente, a menos comum.
Artigo publicado no Diário de Notícias da Madeira - 19 Janeiro 2015

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