10 setembro 2019

A ideia era um projeto de vida para a reforma. O resultado foi um vinho premiado nos melhores concursos internacionais

15:42

O terreno que procuravam tinha um "problema", a vinha. Cinco anos depois, o problema transformou-se num produto premiado internacionalmente e que prova que da Madeira podem vir bons vinhos brancos.



Do vinho da Madeira, o relato mais comum é que regou a independência dos Estados Unidos, o que já não seria coisa pouca. Algumas referências incluem-no também como nota literária em obras como “Henrique IV” de Shakespeare e há quem se lhe refira como o “vinho da eternidade” devido ao seu prazo alargado de consumo.

E, em regra, este é “o” vinho da Madeira de que ouvimos falar e que vem nos livros da História.

A história que hoje aqui trazemos é outra. Tem pouco mais que um par de anos e, apenas partilha com a ancestral, o facto de ser sobre um vinho que surge por acidente. Falamos do Terra Bona, um vinho branco da Madeira, premiado com medalhas de bronze em dois dos concursos de vinhos mais prestigiados, o IWC e o Decanter, em Londres, e com uma pontuação de 90 pontos pelo conceituado crítico americano Robert Parker.

Tudo isto num vinho que não estava nos planos de Marco Noronha Jardim e de Maria João Rosa quando compraram a Quinta do Cardo, na freguesia da Boaventura, na Madeira. Aliás, o vinho – ou para sermos mais exatos, a vinha que existia no terreno da quinta, começou por ser um problema.

No relato direto: “Este projeto nasce de termos encontrado este terreno e nos apaixonarmos por ele. Ou melhor, eu apaixonei-me e a primeira coisa que fiz foi telefonar à Maria João a dizer ‘vi um terreno fantástico e tens de cá vir. Tem um problema, tem vinha’”, conta Marco Noronha Jardim.



Cinco anos depois, o “problema” transformou-se num vinho premiado, elogiado e que mudou o rumo da própria quinta adquirida para propósitos turísticos e agora adaptada a servir também uma vinha e um negócio suportado no vinho. O “projeto de reforma” dos dois bancários transformou-se assim numa aventura pelos vinhos que ainda agora está a começar.

Voltando ao início.
Era uma vez uma quinta, localizada em plena Floresta Laurissilva, património mundial, e que tinha lá plantada uma vinha abandonada com 22 anos em relação à qual os novos proprietários não sabiam bem o que fazer. De conversa em conversa, e tendo presente que queriam fazer do espaço um local privilegiado de agro-turismo, decidiram pedir ajuda e apoio para a recuperar. E em 2016 decidiram agarrar a vinha e produzir um vinho: “a nossa ideia era produzir algumas garrafas de vinho para vender no projeto turístico”.

Contrataram ajuda profissional, recuperaram a vinha e introduziram um conjunto de atividades “tendencialmemte biológicas” e com respeito pelo meio ambiente. O que é que isso significa? Basicamente “não deitamos remédios nem herbicidas” e “o terreno está ¾ do ano em biológico e entre abril e agosto é que há um conjunto de tratamentos com produtos fitossanitários”. Daqui resulta que sejam “o primeiro produtor de vinho com as vinhas licenciadas em produção integrada”.

Mas não percamos de vista o vinho. Em 2016, Marco e Maria João têm então o seu primeiro vinho. Tecnicamente um produto da casta Arnsburger através de um cruzamento com origem na casta Riesling. Para leigos, a casta alemã Arnsburger é muito semelhante aos ditos Rieslings, castas da Alsácia francesa de onde resultam vinhos muito aromáticos – e já bem conhecidos mundo fora.

“A nossa ideia era que o vinho fosse bebível, com toda a franqueza”

“Nós fizemos um vinho com o que tínhamos, introduzimos 10% de verdelho de umas vinhas de uma tia da Maria João”, conta Marco, “a nossa ideia era que o vinho fosse bebível, com toda a franqueza”.

De bebível, o vinho – branco - da vinha abandonada passou a coqueluche junto a amigos e pessoas a quem iam dando a provar. Mas, na dúvida – seria gentileza? – Marco e Maria João decidiram “avaliar ao mais alto nível” aquilo que “toda a gente dizia que era maravilhoso”. E é aí que surgem os concursos de vinho em Londres e a avaliação de Robert Parker. Foi a prova que o vinho era, de facto, bom, e também que “na Madeira podem fazer-se bons vinhos brancos”.

A partir daí o projeto transformou-se. As unidades turísticas, cuja construção se deverá iniciar entre novembro deste ano e janeiro de 2020, reduziram-se de seis para cinco para preservar ao máximo as vinhas existentes e os proprietários da Quinta do Cardo decidiram criar uma micro-adega para produção de três vinhos distintos, 1500 garrafas não mais. “Pequenas produções, pequenos lotes de outros vinhos com parcerias de outros produtores da região”, dizem.

Nestes três anos, os dois bancários que procuravam um projeto de vida alternativo, aprenderam também muito sobre a vinha e o vinho. “Nós acreditamos é que é possível fazer excelentes vinhos na Madeira e que é preciso ter o controlo da produção da uva”, afirmam. Este ano, os dois selecionaram uvas bago a bago, tiraram todos os bagos estragados de todos os cachos. No dia seguinte começaram a vindima às 5 da manhã para evitar maturação da uva depois de apanhada e antes de entrar na adega. Assim, dizem, “toda a uva que entra na adega é uva boa e isso tem um impacto brutal no produto final”.



O projeto turístico também mudou – será turismo mas ligado à vinha, batizado em conformidade como Terra Bona Nature & Wine. Mas tudo se manterá pequeno, quase artesanal. “Temos como compromisso ter um terço da produção para o mercado de Lisboa e Porto, um terço para mercado regional e um terço para nós”.

Nasceu assim o ‘Terra Bona’ Family Harvest, uam história improvável de um vinho branco da Madeira.
Uma vinha pequena, uma uva escolhida à mão. “É assim que é e não vai mudar”, dizem os donos.

Fonte: Sapo.pt 

Escrito por

A Academia Madeirense das Carnes - Confraria Gastronómica da Madeira é uma associação sem fins lucrativos, que promove e defende a Gastronomia Regional Madeirense e todo o seu partimónio cultura.

0 comentários:

 

© 2013 Confraria Enogastronómica da Madeira. All rights resevered. Designed by Templateism

Back To Top